Fabricantes de veículos propõem Reintegra de 10% para aumentar exportações

    [Fonte: Automotive Business]

    Estudo aponta que devolução de resíduos de impostos poderia elevar vendas externas em 1 milhão de unidades 

    Na tentativa de sensibilizar o governo para aumentar as exportações de veículos, fabricantes instalados no Brasil começam a fazer barulho em torno da proposta de criação do Reintegra de 10%, que devolveria aos exportadores este porcentual sobre o faturamento das vendas externas, como forma de compensar os impostos que são embarcados junto com cada carro brasileiro enviado para fora do País. Em troca dessa restituição, em tese as fábricas produziriam mais, gerariam mais empregos, recolheriam mais impostos e assim devolveriam com sobras aos cofres públicos os recursos recebidos. A medida é defendida por todos os representantes do setor que participaram do Fórum Estadão Think “Exportar para Gerar Riquezas e Emprego”, realizado em São Paulo na quarta-feira, 12.

    Para apresentar uma proposta palatável ao Ministério da Economia, que não seja classificado como um novo pedido de incentivos ao setor, a associação dos fabricantes, a Anfavea, encomendou um estudo à AT Kearney, que calcula em cerca de 15% o custo dos impostos embutidos em cada veículo exportado pelo Brasil hoje.

    Segundo estima a consultoria, a devolução de parte desses recursos via Reintegra de 10% do valor das exportações tem potencial para elevar em torno de 1 milhão de veículos por ano vendas externas do setor, aumentando o total exportado para perto de 1,5 milhão de unidades/ano, o que criaria mais 120 mil empregos na cadeia automotiva, gerando ao Fisco algo como R$ 8 bilhões em impostos adicionais. Dessa forma, a medida poderia devolver competitividade internacional ao produto nacional sem causar nenhum rombo nas contas públicas – muito pelo contrário, aumentaria a arrecadação.

    “Não estamos pedindo benefícios ou renúncia fiscal, é o contrário, é só a restituição de resíduos de impostos que incidem sobre as nossas exportações, que ao crescer vão gerar uma conta positiva aos cofres públicos”, ponderou Luiz Carlos de Moraes, presidente da Anfavea.

     

    Segundo ele, a proposta de elevar o Reintegra a 10% seria uma solução emergencial necessária para equalizar custos, tornar o veículo brasileiro competitivo no exterior e assim destravar as exportações brasileiras do setor, enquanto não for feita a reforma tributária e até que ela faça efeito prático nos negócios. “Não dá para esperar as reformas, é preciso enfrentar esse problema já. Quando a reforma vier e se corrigir as distorções do sistema tributário brasileiro poderemos abrir mão do Reintegra sem problemas, mas agora precisamos do mecanismo. Com ele poderemos buscar já novos mercados para nossos produtos”, afirma Moraes.

    Em 2014 foi criado o Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para as Empresas Exportadoras, o Reintegra, com devolução de até 5% do valor exportado para compensar tributos embutidos. Contudo, a crise econômica provocou queda de arrecadação de impostos, aprofundou o déficit público e o governo cortou incentivos, reduzindo a restituição ao atual nível de apenas 0,1%. Agora a indústria tenta convencer a área econômica a rever a questão com o argumento que elevar o porcentual do mecanismo compensatório vai gerar mais receitas, ao invés de reduzi-las.

    Os fabricantes de autopeças também defendem a medida como forma de devolvert competitividade internacional ao setor. “Nossa obrigação é discutir a desoneração com o governo e depois vamos ver se tem espaço para isso ou não. O fato é que a não recuperação desses créditos inviabiliza nossas exportações, que poderiam crescer muito mais”, afirmou Dan Ioschpe, presidente do Sindipeças.

    SAÍDA ESSENCIAL

    Com excesso de capacidade produtiva, vendas internas em ritmo lento, câmbio desfavorável para importações e derretimento do mercado argentino – até agora o maior comprador de veículos brasileiros, ficando com quase 60% das exportações –, a indústria automotiva instalada no Brasil enxerga nos portos a única saída viável para reduzir a ociosidade das fábricas e aumentar o faturamento em moeda forte. Segundo os fabricantes, os mais recentes investimentos tornaram o produto nacional atraente no exterior, há oportunidades em diversos mercados, mas os resíduos de impostos acumulados na cadeia produtiva encarecem os preços e inviabilizam o crescimento externo.

    “Quando avaliamos os custos de produção aqui e no México, por exemplo, vemos que eles são quase iguais, mas os impostos embutidos tornam o produto brasileiro muito mais caro e assim não conseguimos competir. O Reintegra é uma forma de compensar isso, não é incentivo setorial. O ponto é não tirar do Brasil a possibilidade de se tornar um polo de exportação, porque isso é fundamental para a sobrevivência da indústria aqui”, afirmou Carlos Zarlenga, presidente da GM América do Sul.

    Também participante do evento, Zarlenga explicou que as exportações são essenciais obter faturamento em dólares, para assim compensar as importações de componentes e garantir rentabilidade, que no caso da GM desapareceu no Mercosul com a desvalorização cambial do real e do peso argentino. “Precisamos ter retorno sobre os investimentos que fazemos na região e não vamos conseguir fazer isso sem transformar o Brasil em um polo exportador”, sentenciou.

    Para aprovar a majoração do Reintegra e exportar mais, o executivo disse que “até aceito fazer um trade off, com a elevação dos impostos locais para desonerar as exportações, porque um chileno ou um peruano não pode pagar impostos de brasileiros”.

    AUMENTO OU PERDA DE RELEVÂNCIA

    Zarlenga voltou a lembrar que o mercado brasileiro equivale amenos de 3% das vendas globais de veículos, portanto não é capaz de sustentar sozinho o número de montadoras instaladas no País nem a capacidade instalada em torno de 4,5 milhões de unidades/ano. Em 2019, com a substancial queda de exportações para a Argentina, a produção mal alcançará 3 milhões, ou menos de três-quartos do potencial produtivo, e as vendas externas mal chegarão a 500 mil, ou menos de 17% da produção estimada.

    “É muito pouco, podemos elevar as exportações a pelo menos 25% a 30% da produção”, destacou Luiz Carlos de Moraes, o presidente da Anfavea. “Temos presença irrelevante na América Latina, que é um mercado de 5 milhões de unidades/ano. Quase não existimos na África e Oriente Médio. Há muitas oportunidades a explorar se tivermos custos competitivos”, completou.

    Antonio Filosa, presidente da Fiat Chrysler Automobiles (FCA) América Latina, concorda que o Brasil precisa explorar mais os mercados regionais, citando mercados a ser melhor explorados como Chile (400 mil/ano), Colômbia (300 mil) e Peru (200 mil). “Sempre que fazemos reuniões da companhia para decidir onde alocar investimentos, se olhar o Brasil sozinho não ganhamos nada, mas se considerar a região toda com 5 milhões de unidades/ano em 2022/23, já começamos a ganhar mais atenção”, conta.

    “Temos condições de crescer. Nossos produtos aqui, como a linha Jeep, são globais e feitos em fábricas até muito mais modernas e eficientes do que nos Estados Unidos e no México. Precisamos ganhar relevância para não ficarmos atrás em tecnologias como eletrificação, inteligência artificial e conectividade. Não queremos perder esse trem”, concluiu Filosa.

    Para Philipp Schiemer, presidente da Mercedes-Benz do Brasil e Daimler América Latina, existe ainda uma outra questão fundamental relacionada com a necessidade de aumentar a relevância do País no cenário global: a falta de atratividade para investimentos.

    “O mundo automotivo global está se transformando rápido e nós não estamos prestando muita atenção a isso aqui. Veículos elétricos, compartilhados e autônomos vão exigir muitos bilhões em investimentos. O capital é escasso e as empresas vão ter de limitar onde vão gastar. A indústria não vai colocar dinheiro em países que não são competitivos. O tempo está correndo e se a produção no Brasil não voltar a crescer as empresas podem perder o interesse pelo País, que não vai mais atrair investimentos, poderá ficar para trás em tecnologia”, alertou Philipp Schiemer.